Uma
escrita violenta à medida do absurdo das nossas vidas – um realismo sem nenhuma
complacência para com as convenções, a imagem social, o fingimento, o cinismo, a
paz podre que atapeta as casas de muito antro familiar e lá se instala.
Nem
vale a pena sequer fingir que temos esperança, que temos uma vida “… o azar estatístico de nascer português,
uma porra de país em que parece que as coisas funcionaram e afinal não …” ,“…. jantares de merda a custar os olhos da
cara, gajas e futebol” “ … e ninguém
pode viver disto, desta romaria maquinal a bares e restaurantes.” Pessimista?
Serenidade, diz uma das nossas colegas, nem
sempre, digo eu. Muito menos quando Luís Francisco refere certos lobbies da cultura, parece que os
estamos a ver – uns “ … enciclopédia de
sensibilidade artística…” outros, “
…para lhes regarem o ego” – opinião mordaz de um dos intervenientes da história que se interroga se “…havia de
aproveitar para os mandar à merda.”
Poderosas,
as palavras de machos muito machos “…a
bexiga das mulheres deve ter sido feita na mesma fábrica de pigmeus onde lhes
montaram o cérebro… “
Mas
a cada leitor seu sentimento. Segundo o autor, há até quem tenha atribuído a estas
personagens o epíteto de disfuncionais.
Se
bem que concorde com os que encontram na narrativa uma diferença de tom a
partir de determinado ponto – a que alguns podem chamar serenidade, cá eu leio outra coisa, provavelmente tão longe da
verdade como qualquer outra, que nestas coisas é só a gente a falar, que nem sequer,
ou ainda menos o autor saberá o que a alma lhe ditou.
Leio
certa suavidade, a raiva do início a adormecer para o final da narrativa, tenho
a ilusão de ter lido uma razão maternal. Não se ponham com gritos de que já cá faltava esta, pois Freud explica,
e o amor de mãe blá, blá, blá. É que Lena
e Joana se podiam chamar esperança e
até Pedro imagina – Sinto que cheguei a
bom porto. Mas nada é certo, que a narrativa se abre, tal qual a vida que passa por aqui, uma roda-viva.
O leitor a ler à sua maneira. Vale, digo eu, à nuestros hermanos.
O
que gostaria de ter sugerido ao autor – Fale-nos da sua mãe. Ou das mães da sua
vida. Podia ter aproveitado a breve referência que fez mas achei que não devia insistir
– Aprofunde lá isso, Sr. autor.
Não conhecia o Luís Francisco. É sempre um
risco que pode não compensar conhecer a pessoa que o autor é, ou mostra em público.
Todos somos muita coisa e iludimos muito de nós, para o pior ou para o melhor.
Não acontece com este homem de valores que vão rareando e, como disse a Rosa,
transparente. Alguém que é capaz de admitir que chora, com lágrimas e tudo.
Maria João Carrilho
(Grupo de Leitores da Biblioteca Municipal de Oeiras)
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